quinta-feira, 22 de julho de 2010

LOLA E BRIGITTA IV

O AMOR.
Leu afoita e com o coração ainda acelerado os versos enquanto Brigitta a olhava entusiasmada. Lola sentia ainda o sangue borbulhar nas suas veias, mas, não conseguia parar de ler a revista com poemas, enquanto a amiga ria da forma que Lola usava a voz rouca e firme para ressaltar as palavras do poema para dar dicas involuntárias de como estava se sentindo.

Brigitta admirava a maneira distante que Lola enfrentava seus sentimentos. Era como se observasse de longe, sentada em uma confortável poltrona, seu coração bater. Assim, ria quando batia em descompasso e fazia caras de esnobe quando o batimento ficava sôfrego de decepções. Ria daquele instante em que a amiga, em desespero, tentava descrever o que estava sentindo da sua maneira peculiar, mas, entendia que a poltrona não estava tão confortável e que possivelmente Lola não contaria para ela verdadeiramente como e o que havia acontecido. Talvez contaria depois de uns dois dias, rindo da maneira boba que se comportou.

Colocou a velha revista sobre as pernas e pediu para Brigitta contar novamente sobre o primeiro beijo que Jean lhe deu a alguns meses atrás. Então colocou sua cabeça no colo da amiga, enquanto Brigita tentava achar outras palavras e por outro ângulo se encantar e encantar a amiga com aquele momento.

Brigitta viu Jean todo engravatado na saída da igreja em um domingo frio, a mãe o puxava pela mão como se ele fosse uma criança pequena precisada de cuidados, mas, Jean, já era adolescente! Brigita já tinha reparado na escola os primeiros pelos da barba no rosto do menino e isto a embrulhou o estômago! Este foi o primeiro sentimento que teve em relação a Jean Pierre Molde. O segundo foi se interessar pela maneira que a família o cercava de carinho, logo aquele menino maltrapilho e peralta da escola, com uma mãe que o puxava pela mão e o penteava para os domingos como um homenzinho?! As próximas vezes que Brigitta observou Jean sempre perdia tempo com coisas em particular. Foi assim que viu que Jean tinha olhos imensos de um azul escuro e que em dias específicos pareciam querem saltar para a vida. Viu que quando Jean sorria uma covinha do lado esquerdo do rosto se formava e que, suas mãos eram pequenas e que, seu cabelo tinha cachos e redemoinhos indomáveis e que, corria mais rápido que os outros garotos e que, não puxava seu cabelo como puxava das outras meninas e que, de tanto reparar e querer reparar mais, sentia uma coisa estranha na barriga quando seus olhos cruzavam o de Jean. Então, começou a querer ir em todos os domingos a igreja e Lola reclamou muito quando a obrigou a mudar de lugar para ficar mais perto do menino. Então… Começou a passar uma cor nas bochechas para ir na escola e a deixar os cabelos livres na hora do lanche. Então… começou a ir dormir mais cedo e ficar acordada na cama imaginando, Jean e ela, personagens dos livros de romance. Estava apaixonada.

Primeiro Jean se aproximou de Lola. Juntos fizeram muitas peraltices até que um dia voltando a escola se ofereceu para levar os livros de Brigitta e o esbarrar de mãos fez seu coraçao aos pulos, mas, se manteve firme e não desviou os olhos dos olhos de Jean durante todo o trajeto, enquanto Lola fazia suas traquinagens, os dois trocavam olhares e sorrisos até chegar no portão da casa da Brigita. E foi assim por longas semanas até Jean convidar Brigita para passear no lago no sábado seguinte. Brigita sabia que Jean era seu primeiro amor e sabia que toda aquela ebulição de sentimentos era paixão e estava segura e preparada para o amor. Jean a beijou na beira do lago em um final de dia alaranjado, logo após de se declamar em amores. Brigitta não fugiu do seu hálito doce de menino e nem sequer mostrou medo da língua a procurar pela sua saliva, nem desviou dos olhares de Jean, nem das suas mãos ligadas a sua a caminhar pelo lago…

Eu o amo. Disse Brigitta enquanto prendia o cabelo da amiga com um laço de fitas. Lola, adorava a história de Brigita e Jean. Sempre pedia para que ela repetisse a descrição do amor e ria sobre o frio na barriga e o bambear nas pernas.

Apesar de achar nobre o amor e estar curiosa sobre paixão, Lola estava com medo com do descontrole que o beijo causou em seus pensamentos, mal conseguiu escutar o que Brigitta te recontou, não conseguia raciocinar sobre coisas que tinha que fazer para ajudar a mãe, só a boca, as mãos nas costas, o beijo e o tal embrulho no estômago, por outro lado, entendia melhor o estado poético das palavras de amor e queria ler todos os romances novamente, e queria….

Não disse a Brigitta sobre o beijo, embora soubesse que a amiga estava curiosa, foi embora “da casa” em silêncio, precisava racionalizar sobre o amor.

quinta-feira, 15 de julho de 2010

...

...penso que o amor é assim
e que quando você me beija
penso que é assim:

um pouco de mel
um pouco de delírio
um pouco de afeto

penso que sem você
morreria
explodiria
acabaria:

no pó
na sarjeta
na tristeza.

fecho meus olhos
e abraço você:

seus ombros fortes
seu corpo quente
sua ternura macia


penso que
se…
penso que….
penso

não penso.

(Video da maravilhosa, espaçosa e grandiosa Nina Simone, interpretação deliciosa da intensa I Love You Porgy)

segunda-feira, 12 de julho de 2010

Plácido e o fabuloso mundo do futebol.

Plácido conhecia bem a vida. Já tinha vivido intensamente de tudo um pouco, se jogado de modo ousado em situações e caminhos que alguns poderiam julgar imorais, insensatos e loucos. Para Plácido isto era apenas a vida. E era assim que para as alegrias, se diluía por dentro em felicidade e força. Para as decepções, hibernava no seu interior, dizendo a todos: “são coisas da vida”.


Enquanto sua mãe chorava no quarto, ele escolheu no armário as roupas para levar no hospital onde o corpo do pai se esvairia sem vida . Do sofá, o observei passando a escova de brilho nos sapatos pretos do pai. Vi aquele homem forte e sagaz desmoronando, com olhos escorrendo de uma tristeza infinita. Podia até escutar o choro silencioso de Plácido se fundir ao barulho ensurdecedor do lustro no sapato preto que tinha um destino frio e obscuro.


Foi assim, cabisbaixo, demolido e desesperançado que Plácido seguiu por sua vida após a morte do seu velho. Sempre esteve firme e preparado aos fortes trancos da vida, mas, desta vez…Era como se toda sua força e ardência pela vida tivessem sido enterradas naquele dia quente de Julho. Fechava os olhos a qualquer momento do dia e revivia o concreto sendo unido aos tijolos iluminados pelo sol escaldante tendo o som arrastado da pá do coveiro batendo no concreto como trilha sonora angustiante.


Sem se dar conta, sem movimentos próprios, sem que suas pernas o levassem, viu sua vida ir ladeira abaixo, viu e aceitou. E aceitou sem forças ou reação. Era o trabalho que entrou em crise, era a falta de vontade para qualquer mudança ou novo investimento, era o abandono da família e dos amigos, era o tanto o faz para ter qualquer relacionamento.


Inerte, passava longos dias em seu apartamento. Em poucos momentos se sentia triste, na maior parte do tempo era tédio. Era preguiça. Era desânimo. Era nada. Horas sem fim na frente de um computador lendo e procurando exemplares antigos de revistas em quadrinhos, curiosidades toscas sobre a vida animal e muita pornografia bizarra. A televisão era ligada 24 horas por dia passando as mais nojentas séries americanas, que eram vistas e revistas quando Plácido não estava dormindo entre roncos de cuecas no sofá. Do sofá, para a geladeira, a olhar catatônico por longos minutos, até inventar sanduíches esquisitos com ingredientes em nada combináveis em sabores e consistências. Da geladeira ao banheiro, em banhos demorados com um Plácido de olhos parados por longo tempo sentindo a água escorrer pelo ralo e só.


Só. Nem álcool, que lhe causava náuseas. Nem a boémia de antes, que sentia sono. Nem mulheres, que tinha preguiça de convencê-las. Nem amigos e loucura, que sentia a necessidade sufocante de não falar nada, rir de nada, sentir nada.


Plácido não queria morrer, mas, também, viver estava sendo muito custoso. Plácido nunca quis ser um perdedor, nunca fora. Não queria ser um bosta, nunca fora. Nunca teve uma vidinha medíocre. Mas, a meses que não pensava sobre isto, nem se qualificava e muito menos sabia responder o que o faria um “grande homem” naquele momento. Ele não pensava. Era custoso, queria que o deixassem em paz. Só.


Estávamos nós lá, tentando dar uma força de amigos. Ele com um dos sanduíches toscos na boca e um copo de refrigerante vagabundo no copo sob as pernas, todos reclamando do técnico, dos merdas que tocavam a bola com moleza. E Plácido, lá, parecendo nem prestar atenção, mastigando com a boca aberta o sanduba que fazia escorrer um líquido amarelo na camiseta esgarçada a cada mordida faminta. Sentia falta dos comentários ácidos e engraçados que era acostumado a ouvir da boca daquele maluco. Até que Holanda marcou o segundo gol e Plácido como que por impulso cuspiu os restos do que havia na boca no tapete e saiu em disparada na janela gritando: “TOQUEM AS VUVUZELAS AGORA SEUS CORNOS”….


Silêncio total de segundos até escutar os mais baixos palavrões da vizinhança. Rimos como loucos rolando no tapete, enquanto o velho Plácido parecia meio tonto, meio bobo, meio rindo, meio alegre, meio... Meio que voltando ao normal…