Não serei o poeta de um mundo caduco.
Também não cantarei o mundo futuro.
Estou preso à vida e olho meus companheiros
Estão taciturnos mas nutrem grandes esperanças.
Entre eles, considere a enorme realidade.
O presente é tão grande, não nos afastemos.
Não nos afastemos muito, vamos de mãos dadas.
Não serei o cantor de uma mulher, de uma história.
Não direi suspiros ao anoitecer, a paisagem vista na janela.
Não distribuirei entorpecentes ou cartas de suicida.
Não fugirei para ilhas nem serei raptado por serafins.
O tempo é a minha matéria, o tempo presente, os homens presentes,
a vida presente
(quando a inspiraçao anda sumida pelo cotidiano que terrivelmente nos consome é justo apelar para iluminações santas do grande poeta: Rogai por nós, Carlos Drummond de Andrade)
Enquanto, discretamente, passava seus dedos nos braços dele até chegar nas mãos fortes em espera de afago, notava que seus olhos traçavam o mesmo caminho até olharem cheios de apreensão ao enlaçar firmes de mãos e só então, depois das mãos dadas, é que os olhos se encontraram com um quê de medo, uma porção de frustração, tristeza e de mãos dados se sentiram sumariamente encurralados.
Havia o medo real que depois daquela noite se perdessem um do outro em seus caminhos, foi por isto, que passaram a noite de mãos dadas. A cada nova posição que os deixassem mais próximos em seus sonhos mantinham-se sempre com mãos unidas. Horas somente uma, horas somente dedos que se tocavam, horas, quando o perigo parecia maior, davam-se as duas mãos um ao outro.
Quando veio o dia claro, seus corpos e mãos ainda estavam enlaçados, inocentemente se sentiram salvos. E veio a despedida, as mãos separadas, mãos em abano.
O corredor é longo… as mãos, que mascaram a saudade a disfarçar o risco, agora soltas em caminhos da vida presente, do tempo presente.